quinta-feira, 29 de julho de 2010

O Homem da Lei encantado com Roberto Arlt

Uma das melhores bibliotecas públicas, entre poucas que existem na Bahia, é a Juracy Magalhães Júnior, que era uma biblioteca particular da fundação do mesmo nome e que pertenceu ao General Juracy Magalhães, pai do Júnior, assassinado tragicamente em uma emboscada, eles colocaram o nome do filho na fundação. Nela existe até a mesa em jacarandá, que era do então governador, do seu escritório particular e sua extensa biblioteca com volumes raros e livros presenteados de autores também famosos como Jorge Amado e João Ubaldo, filho da cidade.
Foi alí, que tive o prazer nos anos que residi, de travar uma bela pela com centenas de livros, me aprofundei nos escritores latino-americanos, que sempre gostei, fui de Borges e Sábato a Lezzama e Scorza. Realmente poucos lugares no mundo tem nincho ficcional como a América Latina.
Num certo dia, entediado de corrigir provas dos alunos, era um Deus nos acuda corrigir prova, pois eu caprichava muito na elaboração, que fazia com os alunos escrevessem, daí a revolta na hora de corrigir, atravesei a rua, morava do outro lado, e adentrei na biblioteca, Moisés com cara de sono e Bartola atendendo uns poucos estudantes, eram as únicas almas vivas daquele prédio, um silêncio ensurdecedor, só o som do vento e das folhas no jardim. Entrei e fui para o fundo, na sala de romances, que eram divididos por regiões e línguas. Comecei a tatear e olhar se garimpava alguma novidade, estava numa fase literária latinoamericana, lia qualquer coisa que chegasse em minhas mãos, mesmo em espanhol, passei pelo Jogo da Amarelinha de Cortázar e logo adiante ví um título, "Armadilha Mortal autor Roberto Arlt", só o conhecia de nome, famoso que era, mas nunca me dei ao desfrute de saborear tal engenhosa escrita, gostava muito de contos policiais, gosto até hoje, dizem que é literatura menor, estou pouco ligando pros críticos, eu gosto da boa escrita seja ela qual for, inclusive se foi escrito em papel higiênico, prá mim não importa, o importante é o gênio da lâmpada e não a lâmpada. Peguei-o com cuidado, cherei, adoro cheirar livros, se tiver cheiro de canto e ácaros melhor ainda, e não me contive da alegria, eram contos policiais, um dos gêneros que mais aprecio e gosto de escrever. Me retirei para o meu canto habitue, rastei a cadeira, estiquei as pernas e só parei na hora que Bartola me chamou dizendo que ia fechar a biblioteca, não tinha chegado ainda no final do livro, "Bartola eu vou levar ele" disse, sai com ele embaixo do braço, não queria voltar prá casa prá ouvir lenga-lenga de mulher, "onde você estava? Na escola foi que não foi. Não tem leite, não tem pão, sua filha chorando, êta vida miserável...", fui pro jardim dos veranistas, Itaparica é assim, lugar prá vc ficar em paz é o que não falta. Fiquei em companhia de Arlt até perto das seis horas da tarde, pouco antes de escurecer, me lembro de alguns contos como "A vingança do macaco" e "O enigma das três cartas" se não me engano.
Mas porque eu estou falando isso tudo, é que hoje o Homem da Lei me telefonou lá de Petrolina onde mora e disse que estava perplexo com uma descoberta, ele me perguntou se eu conhecia Roberto Arlt, eu disse que sim, que era um escritor argentino muito bom eu disse, ele me respondeu, bom uma zorra, o cara é demais, estou extasiado com a escrita dele, já comprei pela estante virtual uns quatro livros do cara. É meus caros, a descoberta de uma boa escrita é melhor que um gozo facial, é algo indescritível, foi assim quando descobri Knut Hanssun com seu Fome, Fante com Pergunte ao Pó, Walt Witman com seu Toque, Faulkner com o Som e a Fúria, Gorki com A Mãe, Drummond com sua Rosa do Povo entre outros.

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