sábado, 31 de julho de 2010

  A Edição ao lado é de 1989

                          (Nº129 - Ano XI - 1989)

1977 – Começa a circular a revista Leia Livros, em São Paulo, por iniciativa do editor Caio Graco Prado, da Editora Brasiliense. A revista deixa de circular em 1990.

Eu tinha uma coleção de LEIA, mas me foi usurpada por João Ubaldo Ribeiro, deixei algumas caixas minhas com alguns livros guardados na Biblioteca de Itaparica, algum tempo depois voltei para pegar e só achei as dos livros, a outra com a coleção de Leia João tinha carregado com algumas coisas suas que estavam na mesma sala, disse-me Bartola fiel escudeiro de João, pedi através de Bartola que me devolvesse, ele informou que não tinha mais condições de devolver, deve ter se apaixonado pela coleção, dei uma de namorado traído depois deixei prá lá, estava em boas mãos a coleção. 

quinta-feira, 29 de julho de 2010

O Livreiro do Largo da Carioca

Escrever bem, contar bem uma história, ser mágico com as palavras, traduzir os sentimentos humanos, o pó da história, os objetos, o tempo...bem como tocar bem uma guitarra, fazê-la falar, tocar um bandolim, um sax alto, dedilhar um violão sem dá tempo para a respiração, compor uma música, pintar um quadro, fazer uma instalação, escrever uma peça. São atos próprios de seres imagináveis, estes seres com e sem nomes, conhecidos e anônimos, seres extra classes. Escrever, dizem os entediados e o pessoal da Taradinha*, é um esforço incomum, é um parto diz outros, um exercício intelectual para poucos, só os letrados deveriam escrever, orgulha-se a academia. Na verdade eles, os que falam isso, são pessoas que fazem estátuas de parque dormirem, com seus textos lentos, carregados de antanáclases tiradas de outros textos, sem inventividade alguma, criação nula, sem nenhuma esperança que algo alí mude, sem viscerazitas, enfim, sem paixão, frio e taciturno como geladeira de IML. Romancear é igual a tocar um instrumento ou compor, pouco importa se vc é da academia, o importante é sua alma, alma que não seja Andrade, pois aí é covardia, alma de Vinicius, alma de Dr Rosa, que nasceu médico e se transformou em escritor, alma Neruda que nasceu Neftáli antes de versar algo para alguma dona, alma Alcides com o seu Azul se rasga rubro, alma dos que são contra a mediocridade, o modismo, o ter e não ser, o consumismo e a falta de humanidade.
A vida prega peças, e é uma verdade. Um grande amigo meu levou anos gestando um livro, eu já estava sem esperanças em ver este livro editado, sempre o perguntava como estava indo, se havia progredido, ele sempre empalmava, saía pela tangente, escamoteava de um lado e de outro e mudava de assunto. Eu ficava intrigado, um cara como ele poderia escrever um livro por dia, conhecimento léxico não lhe faltava, experiência de vida muito menos, leitura também não, era um leitor voraz de tudo que existia no mundo, certa vez eu o ví com mais de dez livros na mão, comprados em sebo, eu o perguntei, pois estava na casa dele no Rio, prá que tanto livro assim, as estantes estão abarrotadas, ele me falou num estalo no ar de ser gênio sem dizer que o é " É meu caro tanto livro e tão pouco tempo.." Como ele era um garoto de mais de cinquenta, fiquei com aquilo na cabeça, lembrei de "Navegar é preciso, viver não é preciso" de Pessoa, onde se faz uma anlogia entre a necessidade e a precisão. De que tempo ele falaria, do tempo da correria do dia a dia ou do tempo físico que lhe restava, o tempo da morte, aquela frase me corou e corta até hoje, como aço frio das lâminas das meninas do Mimosa. Ele carregava livro para casa como quem vai montar uma biblioteca ou uma livraria, os livreiros do Largo da Carioca sentiam inveja dele, como conseguia ler todos aqueles livros alí comprados. Era um bom dublê de advogado e funcionário público, dublê de fotografo, mas a sua principal tarefa na terra ele escorregava como rampa de maré limada, ser escritor.
Depois de algum tempo, ficando anos na incubadora, ele nos regalou com um tal "Cartografia da Memória**", desconfiei de início, achei que estava nos passando a perna, a capa do livro muito bonita, com uma fotografia sua, mas o livro era fino, umas duzentas páginas, mas como é que um homem leva mais de trinta anos escrevendo um livro e escreve só isso. Me decepcionei, ele me entregou um exemplar e me fez uma dedicatória, eu como bom baiano e amigo elogiei a capa, coloquei o livro na sacola e fui embora, depois de uns vinhos na casa dele.
Começei a ler o livro, de cara começei a chorar, depois rir, depois chorar, rir, chorar e não parei mais. Fantástico, abraçava o livro, beijava-o, cheirava-o, xingava o meliante que demorou tanto tempo para nos brindar com aquilo, eu só perguntava porque não veio antes, corno, um dos melhores livros que já lí em minha vida, que escrita, vá escrever bem assim nos raios que o parta, como esse cara teve a ousadia de nos privar, como seus escravos, de uma delícia desta. Cartografia da Memória está entre os cem melhores livros que eu já lí em toda minha vida. Bendita duzentas páginas. Obrigado Manú.

* Termo criado por mim e Cid para alcunhar uns falsos literatos que vivem a sombra de grades escritores como Guimarães Rosa e Machado de Assis, nem tem  uma idéia original, os pobres vivem de cópia.
 ** Cartografia da Memória, Emanuel Castro Oliveira - Editora Sete Letras, RJ.




 

No divã virtual com a literatura!


Esse negócio de “postar” é um luxo… Um luxo dos que têm tempo, assunto e vontade de se comunicar.
Tenho, por enquanto, muito tempo, muito assunto, mas pouca vontade de me comunicar.
Na verdade até gosto de me comunicar, mas não para pessoas que não fazem a mínima idéia de quem sou eu e que também não faço a mínima idéia de quem são. Novos tempos... coisas da internet!
Com tantos milhares de sites no ar, falando sobre coisas tão parecidas, só me alenta o fato de saber que se você está me lendo agora, deve ter alguma coisa em comum com o motivo deste blog. E afinal de contas, ele é sobre o que?
Creio que nem o idealizador deve saber ao certo as motivações que o levaram a criar o primeiro post, mas como confio no gosto dele, vou começar a falar o que acho da literatura. Sigo o parâmetro do autor, vamos ver no que dá...
A literatura deixou de ser uma matéria de escola e começou a ser um prazer para mim no momento em que soltei a mão de meus professores e resolvi caminhar com minhas próprias pernas, escolher meus próprios livros, interpretar de minha própria maneira o que lia. Foi nesta liberdade que encontrei o prazer na literatura. Até hoje estamos juntos e é com ela que encontro um alento sem fim para meus problemas, um diálogo fantástico para minhas angústias e um espaço ilimitado para ver até onde vai a criação humana.
Do jeito que falo, parece que a literatura me serve como divã... e não é que só agora, escrevendo sobre o tema, depois de tantos anos me dou conta disto? Acho que é o primeiro momento em que “discuto a relação” com a literatura. Achei que isto era coisa para casais...
Bem, agora vou dar um tempo por aqui... vou tomar fôlego na FLIP, por uns quinze dias, meditar mais sobre essa relação passional entre mim, a literatura (como idéia), os livros (como objetos de adoração), os autores (como ideais a serem invejados – ou não...) e este blog maluco.
Grande abraço do Homem da Lei!

O Homem da Lei encantado com Roberto Arlt

Uma das melhores bibliotecas públicas, entre poucas que existem na Bahia, é a Juracy Magalhães Júnior, que era uma biblioteca particular da fundação do mesmo nome e que pertenceu ao General Juracy Magalhães, pai do Júnior, assassinado tragicamente em uma emboscada, eles colocaram o nome do filho na fundação. Nela existe até a mesa em jacarandá, que era do então governador, do seu escritório particular e sua extensa biblioteca com volumes raros e livros presenteados de autores também famosos como Jorge Amado e João Ubaldo, filho da cidade.
Foi alí, que tive o prazer nos anos que residi, de travar uma bela pela com centenas de livros, me aprofundei nos escritores latino-americanos, que sempre gostei, fui de Borges e Sábato a Lezzama e Scorza. Realmente poucos lugares no mundo tem nincho ficcional como a América Latina.
Num certo dia, entediado de corrigir provas dos alunos, era um Deus nos acuda corrigir prova, pois eu caprichava muito na elaboração, que fazia com os alunos escrevessem, daí a revolta na hora de corrigir, atravesei a rua, morava do outro lado, e adentrei na biblioteca, Moisés com cara de sono e Bartola atendendo uns poucos estudantes, eram as únicas almas vivas daquele prédio, um silêncio ensurdecedor, só o som do vento e das folhas no jardim. Entrei e fui para o fundo, na sala de romances, que eram divididos por regiões e línguas. Comecei a tatear e olhar se garimpava alguma novidade, estava numa fase literária latinoamericana, lia qualquer coisa que chegasse em minhas mãos, mesmo em espanhol, passei pelo Jogo da Amarelinha de Cortázar e logo adiante ví um título, "Armadilha Mortal autor Roberto Arlt", só o conhecia de nome, famoso que era, mas nunca me dei ao desfrute de saborear tal engenhosa escrita, gostava muito de contos policiais, gosto até hoje, dizem que é literatura menor, estou pouco ligando pros críticos, eu gosto da boa escrita seja ela qual for, inclusive se foi escrito em papel higiênico, prá mim não importa, o importante é o gênio da lâmpada e não a lâmpada. Peguei-o com cuidado, cherei, adoro cheirar livros, se tiver cheiro de canto e ácaros melhor ainda, e não me contive da alegria, eram contos policiais, um dos gêneros que mais aprecio e gosto de escrever. Me retirei para o meu canto habitue, rastei a cadeira, estiquei as pernas e só parei na hora que Bartola me chamou dizendo que ia fechar a biblioteca, não tinha chegado ainda no final do livro, "Bartola eu vou levar ele" disse, sai com ele embaixo do braço, não queria voltar prá casa prá ouvir lenga-lenga de mulher, "onde você estava? Na escola foi que não foi. Não tem leite, não tem pão, sua filha chorando, êta vida miserável...", fui pro jardim dos veranistas, Itaparica é assim, lugar prá vc ficar em paz é o que não falta. Fiquei em companhia de Arlt até perto das seis horas da tarde, pouco antes de escurecer, me lembro de alguns contos como "A vingança do macaco" e "O enigma das três cartas" se não me engano.
Mas porque eu estou falando isso tudo, é que hoje o Homem da Lei me telefonou lá de Petrolina onde mora e disse que estava perplexo com uma descoberta, ele me perguntou se eu conhecia Roberto Arlt, eu disse que sim, que era um escritor argentino muito bom eu disse, ele me respondeu, bom uma zorra, o cara é demais, estou extasiado com a escrita dele, já comprei pela estante virtual uns quatro livros do cara. É meus caros, a descoberta de uma boa escrita é melhor que um gozo facial, é algo indescritível, foi assim quando descobri Knut Hanssun com seu Fome, Fante com Pergunte ao Pó, Walt Witman com seu Toque, Faulkner com o Som e a Fúria, Gorki com A Mãe, Drummond com sua Rosa do Povo entre outros.